O objetivo deste blog é servir de arquivo das pesquisas acadêmicas realizadas na região centro oeste do município de São Paulo

sábado, abril 21, 2007

ANÁLISE DOS PROCESSOS EDUCATIVOS DE TRABALHADORES DE SAÚDE EM UBS COM PROGRAMA DE SAÚDE DA FAMÍLIA E UBS TRADICIONAL NO MUNICÍPIO DE SÃO PAULO

IX Mostra de Trabalhos de Conclusão de Curso da EEUSP
TCC - Escola de Enfermagem-USP
Aluna: Débora Antoniazi Del Guerra
Profª Marina Peduzzi
Área de concentração: Administração em Enfermagem

Introdução
O desafio de consolidar o Sistema Único de Saúde (SUS) em uma conjuntura que tende a banalizar o projeto da Reforma Sanitária pede por novos esforços. Para alcançar as necessidades
de saúde da população, o SUS precisa de profissionais que estejam aptos a pensar a transformação de suas práticas e da própria organização do trabalho, que sejam "agentes
emancipatórios" na relação com a população.

A prática educativa que forma e capacita os trabalhadores de saúde e de enfermagem influencia sua inserção concreta nos serviços de saúde, do mesmo modo que esta inserção, o cotidiano do trabalho sofrem influência direta dos processos educativos de seus profissionais.
Então é necessário potencializar a educação como instrumento da gestão e do processo do trabalho em seu modo mais humanizado, visto que o trabalho não constitui apenas a produção de bens e serviço, mas, simultaneamente, é um processo de humanização e subjetivação dos trabalhadores. Portanto, cabe destacar a tarefa de "educar pelo trabalho"e "não para o trabalho". A educação em serviço, orientada sob essa concepção, ou seja, a educação permanente, é um dos "novos esforços" e estratégias de consolidação do SUS.
Entende-se a educação permanente como aprendizagem que emerge do cotidiano do trabalho e, portanto, a se configurar como aprendizagem significativa, na qual o trabalhador é partícipe do processo. O conceito de educação permanente em saúde remete a um conjunto de características
entre as quais se destacam: a valorização da práxis, a busca de transformação das práticas, o enfoque multiprofissional e interdisciplinar e a construção de estratégias contextualizadas que promovem o diálogo entre as políticas gerais e singularidade dos lugares e pessoas (Haddad, Roschke, Davini, 1994; Ceccim, Feuerwerker, 2004).
A educação permanente em saúde foi assumida como política pública pelo Ministério da Saúde – que tem tomado para si a função de reordenar a formação de recursos humanos em saúde (Brasil, 2004), pela articulação entre as instituições formadoras, a gestão dos serviços, a atenção a saúde e o controle social de modo a impulsionar a transformação das práticas de saúde.
Utiliza-se também o conceito de educação continuada, conforme se caracteriza pela valorização da ciência como fonte de conhecimento, pela busca de mudanças no plano das organizações, pela definição de demandas baseadas em necessidades individuais ou definidas em nível central e pelo enfoque nas categorias profissionais separadamente. (Silva, Pereira,Benko, 1989; Peres, Leite, Gonçalves,2005).

Os marcos conceituais da pesquisa estão delineados pelos conceitos de processo de trabalho em saúde, trabalho em equipe, educação permanente em saúde, educação continuada e integralidade - que consideramos como orientadores das ações de saúde, seja com os indivíduos ou com a coletividade, buscando atuar nos fatores determinantes e condicionantes da saúde, garantindo que as atividades de promoção, prevenção e recuperação sejam integradas, numa visão interdisciplinar que incorpore na prática o conceito ampliado de saúde (Albuquerque,
Stotz, 2004).

Objetivos
Analisar a prática dos processos educativos de trabalhadores de saúde em Unidade Básica de Saúde na região da Coordenadoria de Saúde da Subprefeitura do Butantã, caracterizando o perfil dos trabalhadores de saúde, das equipes de trabalho e dos processos educativos.
Metodologia
Realizou-se um estudo de abordagem quantitativa e qualitativa, do tipo descritivo e exploratório, na Unidade Básica de Saúde (UBS) na região acima referida. Esta UBS foi inaugurada na década de 1980, funcionou como unidade básica de saúde tradicional até implantação do Programa de Assistência a Saúde (PAS) em 1996, passando a funcionar como pronto socorro e, a partir de 2001, como unidade básica mista (UBS tradicional + PSF). Tem como área de abrangência 25.000 habitantes que acessam a unidade pelo PSF - 18.000 (divididas em seis equipes) e do modelo tradicional 7.000 habitantes, em uma das regiões mais
precárias quando comparada com as demais da Coordenadoria.

Para a coleta de dados, foram utilizados dois instrumentos. Um questionário de caracterização dos trabalhadores e equipes de saúde, aplicado em fonte secundária e se necessário primária, que contempla as seguintes variáveis: sexo, idade, profissão, especialização, tempo no serviço, tipo de vínculo e equipe a que pertence o trabalhador. Os dados sobre os processos educativos foram colhidos pela aplicação de questionário pelo pesquisador de campo em entrevista, consideradas as variáveis: nome ou título do processo educativo; tema(s) abordado(s); público alvo (a quem se destina); estratégia(s) de ensino; duração (data ou período de execução da atividade); local de desenvolvimento da atividade; e de quem partiu a demanda do processo. Foram entrevistados 13 informantes – chave, representantes das respectivas equipes e áreas profissionais.

As informações coletadas referem-se ao período de um ano (julho 2004 a junho de 2005), foram armazenados em banco de dados Excel 2002 versão 7 do qual foram extraídas tabelas que permitiram uma categorização orientada pelo marcoconceitual.
Resultados e Discussão
A UBS conta com 101 trabalhadores, sendo 55 (54%) estão alocadosno PSF e 46 (46%) no modelo tradicional. O estudo mostra que a incorporação dos trabalhadores de nível fundamental e médio é majoritária, pois auxiliares de enfermagem e agentes comunitário somam (55 - 54%)
trabalhadores. A categoria profissional predominante compõe-se de 35 (34,7 %) agentes comunitários de saúde, cuja gênese e inserção na atenção a saúde são recentes, com um perfil concebido como elo entre comunidade e sistema de saúde, que se configura efetivamente compondo dimensões técnicas e políticas que expressam uma tensão entre os pólos, institucional ou comunitário (Silva, Dalmaso, 2002). Dos 26 profissionais de nível universitário, 25 têm formação e atuação mais orientada pelo raciocínio clínico (perfil biomédico) e apenas um profissional tem perfil psicossocial.

Estes resultados são analisados, tomando em consideração as especificidades do trabalho em saúde - complexidade, intersubjetividade, interdisciplinaridade e multiprofissionalidade - e do trabalho na atenção básica, o que permite destacar a necessidade de articulação entre as dimensões clinica, epidemiológica, social, cultural, bem como de questionamento do modo como as necessidades de saúde vêm sendo apreendidas, tendo em vista uma prática profissional pautada pela integralidade.

Os processos educativos foram mapeados por meio de relatos dos trabalhadores da UBS estudada, sujeitos da pesquisa, totalizando 59 processos educativos no período de estudo.
A analise foi feita pela identificação de elementos presentes nesses processos que permitem fazer a diferenciação entre educação continuada e a educação permanente, com apoio de um quadro comparativo entre ambos os conceitos, produzido pelo grupo de pesquisa(a) .
Dos cinqüenta e nove processos educativos relatos, 27 (45,76%) estão voltados à atividade de promoção e prevenção à saúde, seguidos pelos processos educativos voltados para atividade de promoção, prevenção e recuperação à saúde 20 (33,9%), o que está em consonância com o papel da atenção da básica no SUS.

A análise das entrevistas permitiu identificar categorias empíricas que foram destacadas, pois, embora apareçam com baixa freqüência refletem a relação entre trabalho e educação, pressuposto pedagógico da educação permanente. Estas categorias referem-se à "atividade educativa com o usuário como processo educativo", à "atividade assistencial como processo
educativo" e à "presença de alunos na unidade como processo educativo", respectivamente 2
(3,39%), 2 (3,39%), 1 (1,69%).

Ao analisar a variável público-alvo, identificam –se em 42,2 % das atividades elementos do conceito da educação permanente à medida que se destinam à comunidade, às equipes do
PSF e a todos os profissionais do serviço. Por outro lado, em dez (16,9%) atividades observam-se elementos educação continuada, pois estão orientadas para áreas profissionais individualizadas, entre elas, a enfermagem, fisioterapia e odontologia.
A estratégia de ensino predominante, aula expositiva, referida em 20 (33,9%) atividades, centradas na "transmissão do saber" e alinhadas ao conceito de educação continuada. Contudo ao somarmos as estratégias que estimulam a participação e, portanto, alinham-se ao conceito de
educação permanente, como aula expositiva e prática, discussão em grupo e oficinas de trabalho somam-se 22 (37,25%) atividades, com a discussão em grupo presente em dez (16,94%) registro.
O serviço aparece como expressivo demandante dos processos educativos, com 16 (27,1%) atividades acompanhadas de outras demandas que incluem a comunidade 12 (20, 7%) atividades, o que fala na direção da educação permanente. Por outro lado, 11 (18,6%), seis (10,2%) e dez (16,9%) atividades são, respectivamente, demandas da Secretaria Municipal de Saúde, da Coordenadoria de Saúde da região e outros externos o que configura um total de 27 (45,7%) processos educativos de origem externa ao serviço, aproximando-se da concepção de educação continuada. A maioria das atividades educativas ocorreu em local externo ao serviço, 35 (59,32%) registro e outros 17 (28,81%) processos foram realizados internamente, o que demonstra uma tendência para a educação continuada, visto que a atividade não está vinculada de forma mais direta ao cotidiano do trabalho.

Conclusão
A distribuição dos trabalhadores encontrada no serviço traz a reflexão sobre o processo de implantação do PSF no Município de São Paulo, visto que apenas 55 (54%) trabalhadores estão inseridos em equipes de saúde da família, e estas não respondem à totalidade das necessidades de saúde do território, permitindo ainda o questionamento sobre o modelo técnico-assistencial que tem orientado a prática cotidiana dos demais trabalhadores, atuando na UBS tradicional. Destacam-se a incorporação de pessoal de nível médio, auxiliares de enfermagem e agentes comunitários de saúde e a ausência de profissionais da área psicossocial dada a proporção de 25:1 entre trabalhadores de perfil biomédico e psicossocial.
Quanto aos processos educativos, os resultados apontam para a presença de uma tensão entre elementos da educação continuada que convivem com aqueles da educação permanente em saúde.
Ainda cabe ressaltar o diálogo desses resultados com as contradições e desafios da construção da atenção à saúde integral e, então, da consolidação do Sistema Único de Saúde.

Referências
Albuquerque PC, Stotz EM. A educação popular na atenção básica à saúde no município: em busca da integralidade. Interface.
2004;8(15):259-74.
Brasil. Ministério da Saúde. Portaria n.198/GM, de 13 de fevereiro de 2004. Institui a Política Nacional de Educação Permanente
em Saúde como estratégia do Sistema Único de Saúde para a formação e o desenvolvimento de trabalhadores para o setor e dá
outras providências [online]. Brasília (DF), 2004. Disponível em: (15 set. 2004).
Ceccim RB, Feuerwerker LCM. O quadrilátero da formação para a área da saúde: ensino, gestão, atenção e controle social. Physis.
2004;14(1):41-65.
Haddad J, Roschke MAC, Davini MC. Education permanente de personal de salud. Washington: Organização Pan-Americana da
Saúde; 1994. (Série Desarrollo de Recursos Humanos em Salud, 1000).
Peres HHC, Leite MMJ, Gonçalves VLM. Educação continuada: recrutamento e seleção, treinamento e desenvolvimento e
avaliação de desempenho profissional. In: Kurcgant P, coordenadora. Gerenciamento em enfermagem. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan; 2005. p. 138-56.
Silva JA, Dalmaso ASW. O agente comunitário de saúde e suas atribuições: os desafios para os processos de formação de recursos
humanos em saúde. Interface. 2002;6(10):75-96.
Silva MJP, Pereira LL, Benko MA. Educação continuada: estratégia para o desenvolvimento do pessoal de enfermagem. São
Paulo: Saraiva;1989. p. 8-17.

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